XENIA.
Meu
tio
se matou três dias antes do
meu
nascimento.
Deu um tiro na cabeça com a arma velha e enferrujada que meu pai
tinha comprado quando era moço. Minha mãe só ficava chorando, mas
segurou firme. Me segurou firme por três dias. Então nasci.
Uma
vez meu pai me perguntou por que eu tinha saído pra
esse
mundo, disse que era um lugar ruim de viver. Eu perguntei então
porque
ele
tinha
me colocado dentro da minha mãe.
Meus
pais não se falavam muito. Meu pai quando bebia, me batia quando
chegava em casa. Na escola, a maior parte dos garotos não gostavam
de mim, muitos queriam me bater nos intervalos e no fim das aulas.
Quase todos os dias eu tinha que enfrentar um cara que era maior que
eu. Quase todos os dias eu tinha que provar que eu era mais forte do
que os outros. Nem sempre eu vencia, mas batia neles também. Foi
assim que começaram a me respeitar. Ou simplesmente começaram a
esquecer de mim.
Comecei
a roubar nos supermercados, colocava coisas pequenas dentro dos
bolsos, dentro da bermuda, da camisa, e quando eles sacavam de me pegar eu corria feito
um louco pelas ruas quase vazias ou às vezes lotadas.
Uma
vez me pegaram, me levaram pra casa. Meus pais estavam lá. Não
falaram comigo, não disseram nada. Era uma época ruim como qualquer
outra, como todas as outras épocas
de minha vida
sempre foram. Meu pai estava sem trabalho, ficava em casa durante o
dia, fumando, até que todo o dinheiro acabou e ele não tinha mais
pro cigarro. Saiu e encontrou outro emprego. Era faxineiro em uma
escola. Ele chegava em casa todo dia e dizia que odiava sua vida, que
odiava seu trabalho, que preferia morrer, que queria morrer a
continuar com aquilo,
mas nunca fez nada como seu
irmão
fez, o que sempre me levou a pensar sobre a estranha necessidade que
muitos
de nós
temos
de continuar vivos, mesmo estando em situações nas
quais nos sentimos completamente mortos por dentro.
Um
dia um garoto chegou falando que um tornado estava se movendo, que
chegaria
em nossa cidade naquela
tarde.
Ninguém nunca tinha visto algo assim,
era só coisa de filme. Nós éramos crianças. Ficamos lá, depois
da aula, esperando o tornado chegar.
24/10/2011
01:50
Andreas Duscha, Twister
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