OUTROS DESTINOS.
“Eu
tinha alguma esperança e aí tudo morreu como um demônio em
chamas.”
Camila
Fraga.
Era
fim de tarde. Ela tinha me pedido para encontrá-la na velha praça.
Quando cheguei, já tava lá sentada fumando um. Os brinquedos velhos
e enferrujados que brincamos anos antes. Agora já parecia que muito
tempo tinha passado. Aproximei e sentei ao seu lado.
-Como
é que tá?
-Quebrada.
Como se tivessem retirado algo de mim. De dentro de mim. Como se eu
tivesse nascido com asas e tivessem arrancado de mim usando só as
mãos.
Fiquei
em silêncio. Peguei meu cigarro e acendi.
-Acho
que entendo como você se sente.
-Acho
difícil. Mas você pode tentar.
-É...
-A
tarde está agradável.
-O
fim dela.
-Pode
ser o nosso fim também.
-Não
seja tão dramática.
Ela
riu pela primeira vez naquele dia. Pela primeira vez naquele mês,
disso tenho certeza. Me senti feliz por ainda conseguir fazer alguém
rir.
-Você
lembra do tempo em que eu queria ser atriz pra poder sair dessa
cidade?
-Claro.
-Eu
queria sair dessa cidade, loucamente, desesperadamente, queria sair
daqui, encontrar outro lugar pra ser meu, algum lugar que pudesse
chamar de meu. Mas hoje em dia... Não... Não mais.
-Essa
cidade é nossa. Talvez seja a única coisa que nos caiba.
-Sinto
tristeza com isso.
-Eu
também.
-Mas
hoje em dia não poderia mais sair daqui. Sinto como se essa cidade
fosse minha verdadeira mãe. Ela me mal criou, me aborta todos os
dias.
-Tu
quer uma cerveja?
-Quero.
Levantei
e atravessei as duas pistas. Entrei num bar. Trouxe as latas.
Continuamos sentados, fumando e bebendo.
-O
que tu vai fazer agora?
-Não
sei. Continuar vivendo.
-Vocês
já tavam juntos há muito tempo.
-Muito.
Foi um tempo que os relógios não poderiam contar. E agora sinto
como se eu não tivesse mais nada.
-É
a merda da vida. É como as coisas são. Você lembra daquela garota
da banca de revistas por quem me apaixonei? Nem comprar revista eu
comprava antes, mas passei a ir lá toda semana, e comprava algo
dela. Naquela época eu trabalhava legal, tava com uma grana, tava me
sentindo bem. Pensei que iria me querer. Ela não ficou comigo.
Preferiu ficar um outro cara.
-O
que você tá querendo dizer?
-Sei
lá.
-Isso
não tem a mínima comparação!
-É,
eu sei... Foi mal.
Ficamos
em silêncio. Fumando.
-Sabe
o que eu mais gosto nessa cidade?
-Não.
-A
forma como o pôr do sol chega. A forma como a luz deita sobre a
cidade, sobre as ruas, os muros, sobre as pessoas. É uma luz
dourada, é como se a cidade toda fosse banhada por ouro por alguns
minutos de seu dia.
-Você
tem razão, é algo bonito.
-E
não posso deixar de lembrar todos os beijos dados nessa cidade,
todos os abraços e apertos de mão. Simplesmente não consigo deixar
de lembrar disso.
Puxei
dois cigarros, acendi. Um pra mim e outro pra ela. Ficamos lá
fumando e terminando a cerveja. A noite já cairia por completo. As
pessoas começavam a caminhar nas calçadas saindo de seus trabalhos
à procura de suas casas ou outros destinos.
2011
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